Uma brisa numa noite
A noite cai, não escura mas amarela, mas fria e nauseabunda, podre, fria e só. Uma brisa e um trago a amargo, mas doce, tão doce. Um cigarro, e a lua não a encontro. Como também não encontro a alma. Não quero sentir, não quero pensar, quero apenas viver e não sofrer! Uma dor fria. Acho que perdi a alma, mas também não a quero reencontrar, dá trabalho e depois tenho que a usar. Tenho medo da consciência e tenho medo de consciencializar. Tenho medo de tornar a encontrar a lua, mas também tenho medo de viver num Mundo sem ela. Da mesma forma não quero encontrar a alma, mas não posso existir sem ela. Quero ser um corpo, uno e livre. Quero ser água transparente e límpida porque me sinto podre e vazio. Mas por outro lado, quero ser lixo para não exigirem nada de mim. Nada! Porque de tudo estou eu farto. Estou farto de viver, mas não da Vida. Estou farto de pensar, mas não consigo viver sem pensar. Talvez esteja farto de mim como homem, e então queira começar do zero ou então queira reinventar-me, ou inventar algo. Agir tal como penso e não como um animal, que age sem pensar, pois não consegue pensar, ou não tem como pensar. Pois, talvez seja mais um animal, ou então, queira ser um animal. Não sei. Sei que quero sentir esta brisa, hoje, amanhã e depois. Outro cigarro e a lua continua sem aparecer. Afinal onde se terá ela metido? Saberá da minha alma? Quererei apenas amar? Serei eu capaz de amar? Se amar for sofrer, então sim, amo e sou capaz de. Mas os animais não amam ouvi eu dizer, fodem. E fazem-no apenas com um único objectivo. No fundo são seres puros e ao ser puros são livres e ao ser livres, são animais. E serei eu capaz de ser um animal? Talvez não, tenho uma estúpida mania de pensar. Talvez queira ser um vegetal. E sentir esta brisa, hoje, amanhã e depois. E ao querer fazer isso estou a agir como um vegetal. Mas, segundo eu ouvi dizer, também, estes não pensam, e eu tenho uma estúpida mania de pensar, ou então de achar que penso. Será que terão que inventar uma nova categoria taxonómica para mim? A mim parece me bem. Então, um ser que julga amar, que quer vegetar, que perdeu a alma, e que tem a mania de pensar, o que será? Talvez seja apenas um homem, e apenas mais um homem. Que julga ser diferente, sentir o que nunca antes foi sentido e saber o que nunca ninguém antes soube. Pois talvez serei apenas mais um homem que perdeu o norte, julgou perder a alma, ou que a quer perder e assim desresponsabilizar-se, e que tem a mania que não vê a lua, quando sabe que a sua existência é indubitável. Talvez seja cego, ou então não saiba ler os sinais, ou então não clarividente o suficiente. Finalmente, sou um homem, e não sei ler a verdade e não sei ser a verdade nem consigo ser verdadeiro, mas no fundo quero ser como todos os Homens, puro e livre.
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